segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

E se for pra falar a verdade,

deixa comigo. Existem muitos blogs de intercâmbio por aí, alguns muito bons, alguns que eu li antes do meu próprio intercâmbio, mas sempre tem uma coisa que todos eles deixam de fora e eu não entendo o motivo. Eu realmente não entendo, já que eu considero ser o elemento mais importante e o que mais te acompanha na sua jornada. Como você se sente.

Como vocês devem ter lido no post passado, eu estou delirando. Mas é delirando que você tem umas ideias geniais, é delirando que você está mais sincero.


Se eu tivesse que traduzir o sentimento geral do intercâmbio, escolheria sem maiores dúvidas a expressão "Ai, meu Deus!". Cobre tudo, todas as áreas. O intercâmbio é realmente um AI MEU DEUS do início até o fim.

Primeiro porque, além de tudo, você está apavorado. Existe um sentimento de pavor e euforia que se apodera de você nos instantes pré-iniciais, em que basicamente o que acontece é que você se sente burro, incapaz e deslocado. Você não entende muito bem por que está fazendo isso, o que é facilmente um dos piores sentimentos do mundo. Você se duvida como pessoa, você duvida seu inglês, seu português e a sua matemática.

Isso sozinho já é muito ruim. A parte pior mesmo é que não tem como fugir. Você vai sentir isso tudo, não importa se você é o orador do colégio ou o chatinho que não fala do fundo. Só deixando isso bem claro. Você vai passar por isso.

Depois, já no seu destino, você vai sentir angústia. Você vai viver angustiado, e esta é a parte que eu não sei explicar direito. É uma espécie de melancolia, em que você não está muito feliz, mas também não está lá   muito entusiasmado pra voltar. Você provavelmente vai passar 2 dias trancado no quarto sem falar com ninguém. Você vai sentir que não vai fazer amigos, vai sentir falta de alguma coisa importante pra você. E vai ser insuportável.


Puxa, você deve estar pensando. Tudo isso parece terrível. Por que devo fazer intercâmbio, então, se é assim que vou me sentir? Porque, meu amigo, intercalado disso tudo, vem um sentimento muito bom, que é o de orgulho. Toda vez que você ultrapassar um obstáculo, você vai se sentir que nem o Obama, chefe de Estado. É uma emoção feito ópio, você não consegue parar de ir atrás dela. E também está lá, sempre presente, por trás da angústia. Às vezes até passa por cima da angústia e deixa você se divertir. De vez em quando isso acontece.

Passando desse martírio, você vai começar a genuinamente se divertir. A duração dessa fase depende de quanto tempo você vai passar lá, mas no geral começa, sei lá, 1/3 (de tempo) depois de você ter chegado. Você vai estar estabilizado e ter uma rotina. Você vai se sentir relativamente seguro e confortável. É quando as coisas começam a sorrir para o seu lado. Seu inglês vai começar a se soltar e você vai se sentir o Obama em tempo quase integral. Parece bom, né? E é.

Mas então, vai acontecer alguma coisa. Tá me ouvindo? Vai acontecer uma coisa, alguma coisa, não importa a coisa, e essa coisa vai te deixar meio abalado. É assim com todo mundo. Essa coisa pode acontecer até mesmo dentro de você. Uma mudança de pensamento, uma leve depressão, varia conforme a pessoa. Mas é inevitável.

Provavelmente nesse momento o lugar que você está vivendo se tornará para você o lugar que você vive. A magia vai se perder e você não vai mais se admirar com qualquer coisa pela rua. É a evolução natural das coisas, é até uma coisa boa. Eu passava pelo Big Ben e não sentia uma compulsão absurda de tirar fotos, muitas fotos, várias fotos. Eu não tirava fotos. Eu morava em Londres, eu não tirava fotos do Big Ben. Era besteira tirar fotos do Big Ben. Só turistas tiram fotos do Big Ben. Eu não sou turista, pois moro em Londres. Londres é o lugar que eu moro. É mais ou menos assim que acontece na sua cabeça.

O que está faltando? Ah, sim. Você vai voltar a se sentir feliz. Estonteantemente feliz, indubitavelmente feliz. Perto de você voltar, digo. Se precisar chutar um momento exato, diria que faltando aproximadamente 2 semanas para você voltar. No meu caso foi menos, mas geralmente as pessoas passam mais tempo no intercâmbio, então pode considerar seu último mês (vamos considerar um espectro maior) um mês muito feliz.

Seu inglês é perfeito, as pessoas são mais amigáveis, a cidade volta a ser linda. Você começa a atropelar tudo, porque percebe que vai voltar logo. Vai querer fazer tudo ao mesmo tempo. É hilário. Você não consegue mais imaginar a sua vida de volta ao seu país natal, pois você está morando naquele outro país. Você pertence também àquele lugar, ele passa a fazer parte de você. 


Sabe o que é chato? Ninguém de volta ao Brasil vai entender isso. É fato. Você está sozinho nessa. Na verdade, se eu tivesse que fazer uma definição de intercâmbio, seria: você está sozinho nessa. Você passa a valorizar mais a sua própria presença, a se valorizar mais como um todo, entender seus limites e desafiá-los sempre que possível. Intercâmbio é sobre você se tornando um super-você. Um você com todo seu potencial em jogo, um você pegando fogo, tinindo. Uma bomba de você. Nossa, como você vai se amar.

E como que tudo que é bom dura pouco, uma hora a sua bomba explode e você volta. É horrível dizer adeus a tudo que você conheceu adeus por lá, primeiramente porque você não vai conseguir se despedir de tudo ou todo mundo.

Querem uma metáfora boa para explicar essa sensação? Meu irmão sempre fica agoniado ao deixar um quarto de hotel. O subconsciente dele sabe que nunca mais vai voltar para aquele lugar. Mesmo que volte para aquele país, aquela cidade, aquele mesmo hotel, ele nunca voltará para aquele quarto, nunca mais será o mesmo. E se você parar para pensar, isso é uma coisa assustadora. É parecido até mesmo com a morte. 

Você morre ao final do seu intercâmbio. Esse super-você se desintegra, vira uma bola de fogo, e a única coisa que sobra é o núcleo ardendo em chamas, e é essa bolinha que você leva de volta para casa. Essa bolinha é você, seu novo você.

Não diria o que sobrou de você, mas o seu recomeço. Porque como uma fênix, eu, você, nós vamos nos reerguer das cinzas e varrer a bagunça e começar de novo. Nos readaptar. Aos poucos, nós vamos parar de dizer "excuse me" nas ruas, ou ficar parados no lado direito da escada rolante. E você pode achar que isso é uma regressão - eu ainda estou nessa fase - mas eu e você precisamos entender que a vida por aqui é diferente.


Agora, se essa vida é o que queremos para nós, isso a bolinha é quem vai decidir. A bolinha é quem sabe das coisas. Confie na sua bolinha. Ela já viu muita coisa. Na dúvida, escute a bolinha.

E lembre-se que só o tempo pode curar algumas coisas. Dê tempo ao tempo, não tome decisões precipitadas, não rejeite tudo o que vem de dentro e respeite seu país. Você não esqueceu de onde veio no seu intercâmbio, não vá esquecer agora que voltou.

Mantenha-se informado a respeito do que acontece no país que lhe adotou, não esqueça dos seus novos amigos. Se possível, escreva sobre isso. Conte histórias. As pessoas gostam de ouvir histórias sobre intercâmbio. 

E sabe por quê? Porque quando você as conta, elas podem ver nos seus olhos um vislumbre da sua bolinha de fogo, aquela pessoa que você se tornou - e todo mundo respeita e admira as bolas de fogo. Sua postura muda, você está mais eloquente. Você agora tem bagagem de mundo. E é assim que você se torna mais uma vez sua versão super, é assim que você não esquece seu super-você.

To the infinity and beyond.


Neste post você conheceu algumas das figuras que pintaram meu intercâmbio de Janeiro/2013. Alguns brasileiros, alguns alemães, alguns suecos, muitos argentinos, todos deixaram sua marca de alguma forma. Muito obrigada a todos vocês e até a próxima. Don't forget to stay awesome.

A metáfora do longo corredor do aeroporto de Lisboa

Ideias são movidas a cata-vento, eu não faço ideia por que escrevi essa frase, o motivo deve ter fugido. Fui atingida por uma gripe do demônio e fiquei delirando por uma semana, dois dias dos quais foram passados em um avião. Você pode imaginar no que deu. 

No meu último dia em Londres, fiquei estressada. Não muito mais do que o normal, eu sempre vivia estressada, mas esse foi realmente estressante, tão estressante que irei compartilhá-lo censuradamente. Não, só pensar nele já me deixa tensa, então acho que só farei uma nota sobre o dia.

02/02/2013 Londres
Congestionamento de 2 horas. Frio. Sol de lascar. Tosse e febre. Perda de passaporte. Náusea no almoço e incapacidade de entender português com sotaque. 

Não foi um dia muito bom. Além do mais, meu corpo rejeitava fisicamente a prospectiva do retorno e minha mente não ficava logo atrás. Eu estava uma pilha de nervos. Essa parte já deu para entender.

Ao chegar em Lisboa, ainda tive que encarar meu maior inimigo. Tal inimigo é nominado erroneamente, pois não o vejo como um vilão, e sim como representação da minha maturação como ser humano durante a viagem e todo o meu aprendizado. Eu ainda estou delirando, ignorem este parágrafo.

Estou falando do grande corredor do aeroporto de Lisboa, lembra dele?

Escrito em 07/01/2013 às 11:07
Não sabia se passava pela fila da imigração ou se seguia direto para a conexão. Eu disse meu destino e a moça respondeu “Sobe”. Subi. Dei de cara com o corredor mais longo e deserto da minha vida. Lá duvidei a existência do aeroporto, do fim do corredor e da minha própria existência.

Após exaustivos minutos de tensão e ansiedade, encontrei o detector de metais e nunca fiquei tão feliz na minha vida por ser revistada, porque lembrei que era isso que devia fazer mesmo.

O poder do grande corredor não deve ser subestimado. Ele realmente faz você pensar coisas. E lá estava eu de novo, eu e a minha febre, atravessando o corredor. Dessa vez foi mais rápido e acho que faltando 1/3 pro fim tive 1 pequeno ataque de gargalhada, mas isso não é relevante pro texto. Eu havia vencido o corredor. Eu havia conquistado o símbolo máximo da independência, eu passei com nota 10 nessa bagaça.

Um momento para o fim da salva de palmas. Podem parar, já chega. Eu consegui. Eu virei gente grande em 1 mês. Eu lidei com traficantes de drogas, eu morei em Londres sozinha, eu tive meu trem cancelado pela nevasca, eu fiz amigos de diversas nacionalidades, eu quase comi feijão doce, eu virei gente grande.


Eu voltei. Eu esqueci disso tudo? Retornar é uma nova imigração. Não posso deixar de pensar sobre Londres, não consigo desligar a minha cabeça, não quero perder nada que acontece por lá. Estou triste e cansada e exausta e deslocada. Sou uma estranha para a minha própria cidade. Ainda tenho muito chão pela frente e sei que apoio para o que quero fazer terei pouco. Preciso de foco, preciso me concentrar. Preciso continuar escrevendo.

Sinto, porém, que meu regresso virá mais breve do que espero. Em Londres me encontrei, agora falta encontrar os meios de explicar o que aconteceu. O que aconteceu? Convencer mãe, convencer a mim mesma de que isso é o certo, de que é isso que eu preciso. Preciso estudar, preciso me informar. Preciso continuar escrevendo.

Preciso parar de delirar e fazer alguma coisa, como fiz no último mês. Minha host mum mandou um email. Ela disse: "Well sometimes in life you have to work very hard to get what you want so that includes having no rest."

Verdade. Agora é hora de ação. Preciso clarear a cabeça e ver onde eu me encaixo nesta bagunça toda. Mas não estou sozinha.

"I'm sorry you had an awful experience with Daniela but I believe it made u a better person and I think you dealt with everything in a mature way despite your age. I believe you will do great things because you are wiser than you see." 

Tem gente acreditando em mim.