quarta-feira, 23 de março de 2011

O DIA FATÍDICO

Dando continuidade à pior viagem do século. Sentem a diferença de quando eu falo de Orlando... e quando eu falo de Boa Vista?

A festa "de arromba" da Nathália durou até de madrugada, e terminou com Nathália, Igor (meu primo legal, sim) e eu brincando de Guitar Hero no iPad.

Quem tava cansado continou cansado, quem tava bêbado continuou de ressaca... e TCHARAM, hoje era O DIA. O casamento.

Tive um pesadelo horrível naquele dia sobre duendes, baleias e um iPad do mal, e acordei assustada.. Tudo isso por causa de um casamento.

Mas você deve estar se pergutando: "Por que tanto ódio nesse coraçãozinho?".

Simples, caro amigo, eu explico.

Eu não sei por que alguém ainda vê motivos em se casar hoje em dia. Diga-me três casais que você conhece que estão há 20 anos felizes e apaixonados, e eu retiro tudo que disser daqui por diante.

Botando tudo na matemática, fica assim, aprendam com a tia:

Casamento = divórcio
Casamento + discussões = divórcio
Casamento + discussões + filhos = divórcio
Casamento + discussões + filhos + ação da gravidade = suicídio

É um contrato que não dá certo naturalmente. E como se não bastasse tudo isso, ainda tem a pompa toda da festa... que é numa igreja.

Este é o ápice do casamento, literalmente. Até a festa tudo são rosas. Mas depois, quando você conhece a verdadeira face do seu companheiro...

Vamos continuar a história.

Casamentos, acima de tudo, são estressantes.

Existe um salão - o único de Boa Vista, provavelmente - cujo dono é super "amigo" da minha "família", o que não é coisa difícil por lá.

É um salão administrado por... bichas. Lokas, lokas.

E eu tinha que entregar o meu cabelo - o meu puro e precioso cabelo - àqueles seres detestáveis. Não porque eles eram gays, mas porque eles eram realmente detestáveis e idiotas.

E acham que você adora fofocar sobre a sua vizinha de cadeira.
Poupe-me.

***

Transsexual lavando o meu cabelo numa sala isolada e escura. Eu estava com medo.
-AH, FOFA, VAMOS LAVAR ESSE CABELO! VAI QUE UM BOFE RESOLVE CHEIRAR E...
A minha cara de total ignorância/repulsa/revolta parou a(o) moça(o).
Bom mesmo.
E ela(e) passou a puxar com cada vez mais força o meu cabelo.
INVEJOSA, SÓ PORQUE EU TENHO CABELO, HÁ.

***

Eu não sei como as pessoas podem ser tão bestas.
Eu estava horrorizada com a cena se desenrolando na minha frente.

As mulheres que estariam presentes no casamento estavam sendo penteadas com cabelos irritantemente lisos com pontas completamente artificiais viradas à là bicha para fora.

E depois, maquiadas de uma forma que TODAS A MULHERES, até o ser mais bonito de Boa Vista (HAHAHAHA), ficasse com cara de drag queen.

E eu repetia insistemente na minha cabeça como um mantra: "Don't be a drag, just be a queen".

Outra... Glitter pra gay é a mesma coisa que arroz com feijão pra brasileiro. Tem que estar incluso em qualquer coisa.

É assim: exagera no glitter dourado canário no olho da moça, depois deixa a cara dela branca como talco, aí você pinta as bochechas de vermelho, passa um batom vermelhão na boca, deixa a sobrancelha parecendo uma arma pronta para disparar e... ALÔ, EMÍLIA!

Eu tentava colocar razão na cabeça das pessoas. Tentava começar uma revolução no salão - A Revolução das Xiquinhas de Cabelo. Mas ninguém me ouvia. A fumaça do secador já tinha encrostado no cérebro delas.

E eu peguei o meu trocinho feliz e comecei a xingar muito no twitter... literalmente. AH, QUE ALÍVIO, O MUNDO ME OUVIA, EU AINDA ESTAVA NA TERRA, O CÉU ERA AZUL DE NOVO...

Falando nisso, não parou de chover em nenhum dia que eu estava lá. Mas isso é outra história.

Vamos pular para o que interessa.

PRÉ-FESTA

Vestido de camadas preto, sandália preta, cabelo preto, olhos pretos... Tudo demonstrava o meu luto.

"Nossa, Ana Karla, você ficou bonita" - dizia o povo que pensava que eu era uma retardada de óculos e cara de autista. HÁ, QUEM É O PATO AGORA?

Pelo menos, aquele seria o meu dia de cisne. Cisne Queen, né Natalie Portman? Eu era a única queen-não-drag.

Migrei pra casa ao lado - da mãe do noivo - e encontrei o caos. Ou quase. Todos preocupados, atrasados, ansiosos e... Bom, não tava legal.

A mãe do noivo estava no cabeleireiro (tortura) até agora.

Quem não estava quase pronto e tirando fotos de tudo ainda estava tomando banho. Nathália queria colocar sua roupa de dama de honra mas sua mãe não deixava, alegando que ela ia sujar tudo antes da hora.

A irmã do noivo enfrentava a odisséia do alfinete.

E um único vulto, uma jovem alta e esguia, caminhando lentamente pelos jardins, parecia se destontear dos demais afobados. Era eu, praguejando ao vento.

Encontrei o novo terminando de se arrumar no quarto, com várias tias e primas dando palpites sobre tudo. Eu nunca tinha ficado tão perto de alguém que ia se amarrar em tão pouco tempo. Duas horas, pra ser específica.

Ele estava elegante de fraque, barba feita... e aparentemente feliz. Não vou discutir.

Não sabia se podia fazer piadinhas de casamento.
Não sabia se podia fazer piadinhas sobre a afobação do casamento.
Não sabia se podia fazer piadinhas sobre o atraso da noiva, a marcha nupcial e o discurso no padre.

Fiquei calada.
Eu queria era ir embora de lá.

"Ana Karla, vai buscar com a Tia Sinhá um alfinete de segurança pra Raphaela" - alguém disse.

Pronto.
Lá fui eu me aventurar pelos matos da vida até chegar na casa da tia. Ela cultiva de tudo naquele jardim, e eu posso jurar que um tomate tentou me morder. Essa é aquela tia que eu falei antes, sabe, aquela que fica sempre na TV, vendo toda a programação da Globo... Mas ela também costura.

Já fez muitos vestidos bonitos, e provavelmente teria vários alfinetes de segurança para prender uma parte do vestido da Rapha, que era madrinha.

Tudo estava escuro quando eu entrei na casinha.

-Tia?

Vi uma lagarta na parede. Me encolhi.

-Tia? A senhora está aí?

Sinto algo atrás de mim na porta, e eu quase pulei de susto quando uma voz irritada e rouca falou atrás de mim:

-Aqui, menina. O que foi?
-A Rapha precisa de um alfinete de segurança.
-Alfinete de segurança numa hora dessas?
-Errr... É.

E ela seguiu para sua mesa de costura. Tirou tudo das caixas, mas nenhum alfinete estava lá.

-Que cor é isso aqui?
-Tia, eu sou tão cega quanto a senhora.
Ela resmungou baixo.

Sim, eu tive que ficar sem óculos pra ir pra festa.

-Essas aí que dizem cuidar da casa... quando você vê, já levaram tudo. Eu tinha tanto alfinete aqui, tanta linha... Porcaria - resmungava.

Eu estava calada - era só isso queu sabia fazer, ultimamente.

Fomos para o quarto dela.

-O meu sapato, o meu sapato que a Tânia guardou, ela nunca mais devolveu. Agora, vou ter que usar aquele que dá calo. Inferno de vida, deixa eu te contar - dizia, enquanto revirava o guarda-roupa.

Achamos em algum lugar o maldito alfinete, e ela quase escorregou no tapete voltando para a sala, o que a fez resmungar mais um pouco.

-Cuidado, tia.

E, em uma hora dessas, estávamos prontos.

A CHATICE

Imaginava aquelas igrejas bonitas, com vitrais nas janelas e pinturas de anjos no teto, tipo as que nós temos aqui em Manaus... Mas um minuto antes de chegar, lembrei que estava em Boa Vista.

A igreja era minúscula - um ovo - assim como a cidade, e tinham insetos lá dentro que ainda não foram reconhecidos pelo homem.

Havia uma fileira na frente, uma única fileira, com uma placa dizendo "SOMENTE FAMÍLIA DO NOIVO". Sim, porque a família do noivo iria certamente caber naqueles cinco lugares. TÁ DE BRINCADEIRA, NÉ?

O povo legal - eu, Carlinhos e Igor, fomos para outro canto, e ficamos em paz.

Pra você ter ideia do absurdo da igreja, um GATO entrou lá dentro e ficou parado diante do altar, admirando Jesus Cristo crucificado. E foi embora sozinho, dez minutos depois.

E o povo já estava atrasado.
Quando que aquela jossa iria começar?

UMA HORA DEPOIS... O povo começa a entrar no altar, ao som de I'm yours... Seria tudo muito legal e bonito, se eu não estivesse praticamente do lado do cara que tocava o trompete.

E entram os avós, os tios, os 3497349435 padrinhos, as mães e os pais, e finalmente... a noiva.

Começou a marcha nupcial, que com um acorde final muito doido, virou aquela música My Girl.

E tudo transcorreu normalmente (e chato), até a hora mais esperada.

O meu sonho é ouvir um NÃO bem alto e claro na hora do "aceito", e a(o) noiva(o) sair correndo pra fora da igreja. CARA, TUDO IA VALER A PENA.

Mas não.

"Eu aceito" - disseram os dois com voz embargada.
"Então... eu os declaro *começa a tocar Viva la Vida*... marido e mulher. Pode beijar a sua noiva, meu caro.

"LEGAL" - gritou um japonesinho gordinho que era "daminho" de honra. PUTZ, eu me acabei de rir, olha. É ISSO que torna um casamento divertido.

Até que chegou a hora de Nathália e as alianças.
Eu estava sem óculos, e não vi a cena acontecendo.

Nathália entrou aos prantos na igreja, emocionando todo mundo.
"Ela ama muito o primo, sabe".

Logo depois se descobre que a menina estava mais nervosa que Harry Potter no seu primeiro jogo de Quadribol.

E a mãe "BORA, NATHÁLIA, OLHA PRA FOTO, ANDA PRA FRENTE!".
Assim até eu chorava.

Ok, mas deu tudo certo.
E já era hora de ir embora.
Não pra casa. Pra...

FESTA

Ir para um casamento é a provação de quanto você consegue aturar uma, no caso, duas, pessoas sem querer matá-las pelo resto da sua vida. Fazem você se arrumar o dia inteiro, te deixam esperando duas horas numa igreja, e como se não bastasse... te mandam pra after party "super animada" depois.

O DJ era péssimo, e só sabia tocar RAP pesado cantado por aqueles negos americanos doidões. Isso antes do povo começar a beber.

E quando não era rap... eram outras músicas terríveis depois.

E eu não tinha levado o meu DS. Sim, eu iria regredir, virar criança de novo, feliz com seu joguinho... porque pelo menos aquilo me faria feliz.

O jantar foi servido à meita-noite... Comida horrível, gelada e podre. Ok, podre não, mas ainda assim, horrível.

A noiva jogou o buquê, e as desesperadas atropelaram todo mundo no meio do caminho pra conseguir "a prenda".

Até que a discoteca começou.

Vem cá, existe alguma lei que PROÍBE música em volume aceitável para o ouvido humano em qualquer festa? Porque lá eles exageraram.

ESTAVA ABSURDAMENTE ALTO.
TOCANDO I WILL SURVIVE.
YMCA.
MACHO MAN.

SOCOOOOOOOOOOOOORRO, EU QUERO VOLTAR PRA IGREJA!!!!!!!!!!!

-Carlinhos, você quer ir embora o tanto quanto eu quero ir embora?
-Não.
Murchei.
-Eu tenho certeza que eu quero mais.

Eu e Sofia, o ser mais sensato da festa.
Carlinhos e eu, os dois irritados, fomos embora da festa no momento que os noivos iam "entrar" nela.

"A noite está só começando, Carlinhos" - ele tentou argumentar.

HAHAHAHAHAHA, LEGAL, FIQUE FELIZ E ME DEIXE IR EMBORA.

Saí da festa.

LIBERDADE!!
É TÃO BOM PODER OUVIR DE NOVO!!!
SINTO QUE POSSO CANTAR, DANÇAR, PULAR COM AS MARGARIDAS NO CAMPO!!

Eu fiquei feliz... porque a cota de casamentos dessa década já estava esgotada.
Agora, só em 2020.

Vocês não sabem o que é um ser humano feliz.

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